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Birra Infantil

Eu quero, eu quero, eu quero! Ou não

Aglacy Mary (*)                                                                                

   

 

 

Talvez você já tenha lido muito sobre o assunto, mas continuam em pauta questões sobre a birra quando pais se encontram, quando professores debatem, quando pais e professores de crianças pequenas conversam. Não resisti, portanto, ao inesgotável apelo, e aqui estamos de volta ao velho tema.

O que significam esses ataques desconcertantes que acometem crianças de um, dois, três anos e deixam os pais de cabelo em pé? Cada fase tem as suas razões. Aproximando-se de um ano de idade, a criança está muito atenta a respeito de todo o ambiente ao seu redor, que reconhece e apreende pelo contato físico, descobrindo algo novo a cada instante. Quando alguém limita sua ação, o que se faz necessário muitas vezes, ela reage com um faniquito, como todo mundo já pôde ver. Entre um e dois anos, sua ação exploratória ganha força com a aquisição da marcha. Agora o mundo está, literalmente, a seus pés, e quem quiser contrariar isso vai assistir a um ataque mais vigoroso. Com o desenvolvimento da fala, nasce a ideia de que tudo lhe deve ser possibilitado, de que ela é quem manda em todas as situações. Assim, determina que vai comer brigadeiro no café da manhã, ou brincar no parque com a roupa que foi feita para usar no casamento da tia. Vai contrariar nosso anjinho? Prepare-se para um CTI (Chilique Total e Irrestrito). Finalmente com maior condição de organizar-se, a criança, a partir dos quatro anos, pode receber mais incumbências, assumir responsabilidades, decidir sobre algumas questões. Isso normalmente reduz a incidência de birras.

É certo que, em alguns casos, esse comportamento pode significar a necessidade de alguns cuidados especiais. Crianças submetidas a situações de estresse, crianças deprimidas ou com distúrbios de hiperatividade, por exemplo, fazem birras que chamam atenção ou pela frequência, ou por não corresponderem ao fato que as teria provocado. Se a família sente-se insegura para avaliar a situação, é recomendável conversar com um psicólogo infantil.

Bom lembrar que muitas crianças levam a birra até muito depois dos três anos, por pura falta de firmeza do adulto, que teme ser autoritário, ou opta por deixar para mais tarde a tarefa de educar.       Desde pequena, ouvir "não" é saber que há limites para sua vontade, para o seu poder. Por menos que pareça, isso dá segurança aos nossos pequenos, que, de um a dois anos, já compreendem o sentido da negativa. O não — firme — que vem de quem nos ama, é preparação para as frustrações vindas de outras partes.

Por outro lado, tenha cuidado com os excessos. Às vezes, diz-se não à toa, para algo que poderia tranquilamente ser permitido. É como a situação em que B., três anos, estava brincando com dois carrinhos, mas pediu um terceiro, aquele amarelo, que estava na parte mais alta do armário. "Não; você já tem dois", disse a mãe. Depois, concluiu que, na verdade, não havia necessidade de negar o brinquedo, mas o espetáculo já havia começado. À toa. É possível também evitar tantas outras situações desagradáveis usando o conhecimento que temos sobre a criança pequena. Você é capaz de prever, por exemplo, que, depois de certo tempo fazendo compras, ela vá precisar de algum bom entretenimento ou de uma parada naquela maratona estressante; continuar, naquele dia, vai resultar em birra na certa.

Tenhamos claro que uma manha ou outra, de vez em quando, faz parte do universo infantil. Mesmo a criança que tem um perfil mais meigo, por vezes, expressará sua raiva por meio da birra. O que nos deve preocupar é o uso costumeiro do artifício para atingir um objetivo. A birra torna-se frequente quando a criança percebe que ela funciona. Chora uma vez e consegue segurar a mãe pelo tempo que queria, ou ganhar o sorvete, ou livrar-se de uma situação incômoda. Repete a ação e é bem sucedida novamente. Agora é fácil — basta repetir a estratégia e plim! Seu desejo é realizado. Os pais podem ter até folga — tempo, dinheiro — para atender aos caprichos do filho. O problema é o que o presente está ensinando para o futuro: nada de flexibilidade, adaptabilidade, nada de esforço para conseguir algo. Basta bater o pé.

Agora, a pergunta que não quer calar: o que fazer quando a criança grita, esperneia, chora, insiste em querer ou em não aceitar algo? "Eu dou uma palmada e resolvo o assunto", dizem uns. A maioria dos pais pode até adotar a palmada, mas concorda com o fato de que corre o risco de precisar, com o tempo, dar mais de uma ou dar uma palmada mais forte que a an-terior para ver algum efeito "positivo". Bem, essa questão é tão velha quanto a própria birra e agora se torna alvo da lei no Brasil.

Descartada a punição corporal, como reagir aos famosos chiliques da criança? Uma boa recomendação é considerar o motivo do aborrecimento. Há ocasiões em que o ideal é o simples acolhimento, como na reação ao cansaço. Pinta o sete, o sono chega e, até se entregar, a criança fica mal-humorada, tem mais dificuldade de enfrentar adequadamente uma vontade contrariada. O colo do adulto é tudo de que ela precisa nessas horas. Em outras situações, quando insatisfeita consigo mesma — "não consigo encaixar os blocos!", "não sei desenhar um leão!", "não consigo pôr sozinha a camisa" — é preciso que seja estimulada a enfrentar os desafios e que a ajudem a perceber que, se ainda não sabe isso, sabe aquilo outro. Festeje, com a criança, as suas capacidades.

Você conhece também as típicas crises de "eu quero a sua atenção a-go-ra!, só para mim". Nesse caso, lembre-se de dar atenção à criança sempre que ela estiver fazendo algo positivo, elogiável, ou quando, simplesmente, não estiver com manhas. Diante da birra para conseguir um intento, o melhor é ignorar o que está acontecendo desde que a criança esteja fisicamente segura no ambiente em que se encontra. Mas estou falando de ignorar mesmo. Não adianta ficar do lado do filho repetindo não sei quantas vezes: "Eu não vou lhe dar sorvete agora. Pare de chorar. Eu já disse que, mais tarde, a mamãe dá sorvete". Você pode até não dar mesmo o sorvete, mas fica ali, alimentando aquela novela, dando uma atenção totalmente inadequada à história, repetindo explicações desnecessárias. O melhor que você tem a fazer é afastar-se dizendo que compreende sua raiva e que retorna quando ele quiser conversar. Permitir que o seu pequeno sinta raiva ou tristeza e ajudá-lo a descobrir como agir nesses momentos são atitudes favoráveis à saúde emocional. O que o adulto não deve fazer é incentivá-lo a expressar seus sentimentos através de ataques. Passada a raiva, não seja ranzinza, não fique remoendo o caso. 

Quando a questão é o interesse irresistível e indiscutível pela posse de um objeto, ou a irritação pelo fato de alguém tê-lo perturbado, uma excelente medida é desviar a atenção de seu filho para outro alvo. Surpreenda-o contando... Já sei! O caso da tartaruga, que... "Oh! Ela perdeu o casco e quase morreu de frio. Você nem imagina como se salvou". Antes do meio da história, a calma geralmente está de volta. 

E quando não dá para ignorar o fato? Nem sempre dá, nem sempre se deve... São aquelas ocasiões em que é fundamental que algo seja feito, ou quando algo deve ser proibido. Negocie o que é negociável, permita que a criança exercite sua capacidade de escolha, mas faça com que se cumpra o que é necessário. É do adulto essa responsabilidade. É possível, por exemplo, que a criança escolha entre escovar os dentes agora mesmo ou logo mais, quando acabar o desenho; que escolha entre o pijama curto e o comprido; não é possível, porém, que opte por não escovar os dentes, ou não se acomodar para dormir. Não esqueça de que a criança normalmente sabe o que virá de você. Sabe também quem é mais frágil diante de suas birras. Sabe a quem recorrer para conseguir o que quer, sabe quem quebra as regras estabelecidas na família, quem cede para livrar-se de sua insistência, ou para desautorizar o outro.

É impossível ignorar também as reações em que a criança se agride, agride os ou-tros, grita ou chora muito forte. Ela quer, precisa, merece ter contidos seus impulsos de agressividade. Mais uma vez, estamos falando de firmeza e afetividade. Juntas. Compreenda que seu filho está fora de controle e não se sente bem com isso. Contenha-o, conforte-o, mostre-lhe que pode contar com a sua segurança.

Como educadores, estudamos, observamos, mas, acima de tudo, vivemos experiências de educação, que devem ser conduzidas pelo amor e também pelo conhecimento e pelo compromisso com o desenvolvimento da autonomia de nossas crianças. É importante que escola e família compartilhem esse bem.

 

(*) Direção da Unidade de Educação Infantil da Nossa Escola – Aracaju/SE)

 

 

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